"Estivemos na Taberna no Mercado, o mais falado dos restaurantes portugueses em Londres, para perceber por que razão há quem o odeie e quem o ame.
A embaixada de Nuno Mendes aos ingleses
É um restaurante português, com certeza. Tem mesas com tampos de mármore de Estremoz e serviços da Vista Alegre. Tem pão e vinho sobre a mesa e, apesar de estamos em Londres no Old Spitalfields Market em Shoreditch, o pão vem de Portugal e a carta de vinhos (portugueses) é de excelente qualidade.
É um restaurante português, com certeza, em Londres, e essa pode ser uma das razões de tanto falatório mas, o que explica mesmo toda a atenção, é seguramente o nome por detrás da Taberna do Mercado: Nuno Mendes, um dos mais conceituados ‘chefs' portugueses, com uma aclamada carreira internacional. Trabalhou com ‘chefs' estrelados em Nova Iorque e desde que se mudou para Londres, há 10 anos, que os seus restaurantes - Bacchus, the Loft, o Viajante - se encontram entre os mais procurados. Actualmente, apesar de passar bastante tempo na Taberna do Mercado, é o ‘chef' do Chiltern Firehouse, restaurante do momento em Londres onde é quase impossível marcar mesa e entre os clientes contam-se as maiores estrelas do cinema, música, moda e do mundo dos negócios. Acaba por ser normal a atenção que despertou este projecto, de comida portuguesa, sem pretensiosismos.
No geral, a maioria das críticas à Taberna do Mercado têm sido favoráveis. O "Independent" ("a comida é tão deliciosa que é impossível comer demasiado rápido") e o "Telegraph" ("larguem tudo e vão lá agora!") são apenas dois exemplos entre muitos que vão do "Financial Times" ao "Daily Mail". Mas houve uma crítica que achou a comida tão má que pensou que "era uma partida, uma brincadeira de mau gosto". Outro "gostou" tanto da experiência que não só comparou o miolo de um rissol de camarão a efluente de esgoto como partiu dali numa cruzada contra toda a gastronomia nacional. "Fishing for attention", até porque quando todos dizem bem nada como dizer mal para se ser reparado. É tão válido cá como lá.
Entre os críticos está, também, contaram-nos na Taberna do Mercado, alguma da comunidade de Stockwell, o Little Portugal de Londres, onde se concentra a maioria dos emigrantes mais antigos. Não é estranho, porque se este é um restaurante português, com certeza, não é bem o típico restaurante de comida portuguesa. A inspiração é essa mas há muita criatividade. Na realidade, nem Nuno Mendes - que tirou o curso em Los Angeles e depois exerceu nos EUA e em Londres, nem o jovem ‘chef' executivo da Taberna do Mercado, António Galapito, que está com Nuno Mendes desde que ele se mudou para Londres, alguma vez chegaram a trabalhar em Portugal. É a sua memória culinária que aqui provamos, com muitas combinações inovadoras à mistura, como uns chocos com pezinhos de coentrada. Prato fantástico, com os pezinhos picados hiper finos. Ou um Tártaro de Porco Bísaro, um porco transmontano servido em pequenos pedaços levemente caramelizados com um caldo de cozido, o nosso cozido, mas apenas num caldo que concentra todos os sabores. Um primor. Ou o prego com molho um balchão de gambas, homenagem à nossa herança goesa. Ou feijão-verde frito em polme, a lembrar uma tempura ou uns peixinhos da horta - tecnicamente fomos nós a exportar a "tempura" para o Japão - e que depois são acompanhados com um molho "à Bulhão Pato".
São apenas exemplos, entre muitos, de uma carta diferente, inesperada e extremamente saborosa. Nossa. Deles. De autor mas também muito simples e honesta. É nesta pequena dicotomia que reside tanto do encanto da Taberna do Mercado.
Na carta estão quase trinta pratos e temos de dar destaque ainda aos enlatados, todos feitos na casa. É uma carta de petiscos, comida para partilhar. É esse tipo de restaurante e não uma coisa formal.
À sua frente está, para além de Nuno Mendes e de Tozé Galapito, que lidera a equipa de cozinha totalmente portuguesa, José Felizardo. Felizardo - muitos poderão lembrar-se dele como o baterista de sempre dos Primitive Reason - é amigo de Nuno Mendes há anos, desde os tempos em que ele e o irmão partilhavam casa nos EUA com o aspirante a ‘chef'.
"Como é do Nuno Mendes", conta-nos, "as pessoas esperavam algo mais elaborado, mas o nosso objectivo não era esse. Queríamos fazer uma comida simples". Mas até por isso, "temos de ter todo o cuidado com os pormenores, os detalhes no serviço, na apresentação da comida." E conseguiram porque o serviço é eficiente, atencioso e simpático. A equipa de sala é internacional, com portugueses mas também polacos, turcos e brasileiros. "Mas todos têm de saber explicar muito bem aos clientes o que servimos. Porque eles não conhecem. Nem a comida nem os vinhos. Temos de fazer esse trabalho, de dar a conhecer os nossos produtos."
Fonte: www.sapo.pt